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Paracheirodon innesi (Tetra Neon)

O Paracheirodon innesi (Tetra Neon) é uma espécie de peixe ornamental muito popular, que conhece uma larga aceitação e merece os melhores comentários por parte dos aquariófilos. Para isso muito contribui a grande resistência a doenças, as cores alegres, a vivacidade e o dinamismo e alegria que imprimem num aquário.

Todavia, é de lamentar que raros sejam os artigos que descrevam as espécies de peixes ornamentais em geral, e em particular os Néons. Os artigos limitam-se a descrever algum facto curioso observado. Falta ao mundo aquariófilo artigos que relatem os comportamentos destes seres vivos com o mesmo interesse, motivação e objectividade que existem nos artigos sobre algumas espécies de peixes de água salgada. Portugal tem proporcionalmente uma boa quantidade de aquariófilos cuja experiência deve ser aproveitada para o desenvolvimento desta actividade tão enriquecedora. Aliás, creio que um dos grandes fascínios de manter este tipo de fauna, é o descobrir comportamentos e atitudes que frequentemente encontramos na espécie humana.

Os Paracheirodon innesi (família dos Caracídeos, género dos Tetras) são peixes originários da região Amazónica (principalmente Brasileira), América do Sul que vivem em águas macias, ligeiramente ácidas e pouco claras (a cor da água assemelha-se a um amarelo esverdeado característica de alguns chás). São peixes que não têm problema algum em se alimentar à superfície mas se atendermos à forma do corpo facilmente concluímos que a sua alimentação se processa nos níveis intermédios. Nisso são exímios! Podem estar longe mas mal um pedaço de comida vai caindo para o fundo, logo aparece um Neons para ir comendo. Se o pedaço foi grande, vai dando pequenas dentadas, despedaçando aos poucos, dividindo e fraccionando até conseguir comer todo o pedaço. Esta espécie tem um grande vigor no que respeita às questões alimentares: são capazes de comer (tal como se come esparguete) larvas de mosquito maiores que o comprimento do seu próprio corpo. É óbvio que depois ficam empaturrados, apresentando um proeminente abdómen, ficando mais lentos e nadando ligeiramente inclinados (na maioria dos casos) em pequenos impulsos.

A primeira coisa que reparamos a observar a espécie é que são peixes gregários, isto é, organizam a sua vida sob uma lógica de conjunto, nomeadamente em cardume. Os Neons são peixes que não aguentam muito tempo sozinhos, precisam de outros peixes para se alimentarem, protegerem, nadarem, etc.

Mas se é inegável que se organizam em cardume, parece-me pouco acertado acreditar que esse cardume forma um todo coerente e organizado. Dito de outro modo, parece-me que existem particularidades, singularidades no comportamentos de cada espécime, de cada peixe em particular, que dão uma nova perspectiva de olhar o cardume: este serve para o Neon fundamentalmente se proteger ( tal como acontece com as sardinhas em alto mar). Esta técnica permite, para além de dissimulação, confundir o predador, fazendo com que este não saiba que peixe atacar, pois só percepciona uma amálgama deles.

Quando se sente seguro, cada Tetra Neon tende a formar pequenos grupos (2 a 4 indivíduos) e espalha-se pelo aquário. Cada exemplar vive de forma individual, explorando o aquário de forma singular. Alguns exemplares têm mais tendência a ir para a zona sombria das plantas, ao passo que outros praticamente só deambulam nas zonas de maior luminosidade (de referir que o meu aquário tem luz de baixa intensidade, tal como os Neons gostam, já que não tendo controlo sobre a abertura da íris do “globo ocular”, não conseguem suportar grandes luminosidade).

Por outro lado, o Neon não “dorme” (este termo não é rigoroso mas é aquele que usualmente utilizamos) em cardume! Cada espécime posiciona-se de forma arbitrária pelo aquário, individualmente. Como estão sós, ficam mais expostos a perigos. Para minorarem as probabilidades se serem detectados durante a noite, tende a descansar junto ao solo, numa posição inclinada ( +- 45º).

Esta imagem (Neons que vivem individualmente) é contrastante como aquela com que o aquariófilo se depara quando introduz no aquário alguns Neons: neste caso, os Neons formam um cardume onde existe um “batedor”, isto é, um peixe que vai na frente dos resto do cardume, observando, “apalpando” o terreno, sendo sua função alertar o resto do cardume em caso de perigo. Nesta situação a locomoção é lenta, pelo que faz parecer que existe muito atrito na água impedindo os peixes de se movimentarem. Este cargo social de “batedor” não é absoluto; é exercido por cada um dos elementos do cardume, conforme a posição que ocupe em relação ao resto dos companheiros. O “batedor” de terreno também pode ter outros encargos, como por exemplo, o de avisar da existência de comida. A comunicação é feita de forma extremamente simples e rudimentar: dirigir-se ao local de comida. Como a estrutura social dos Neons obdece à lógica de cardume, todos estão muito atentos a cada elemento e permanecem geralmente perto uns dos outros, existe uma enorme facilidade de comunicação.

Por exemplo, no meu aquário, são os inteligentes Escalares a identificarem a existência de comida (ou a sua possibilidade). Quando os Escalares se deslocam à zona onde habitualmente os alimento, de imediato, os Neons se deslocam (em cardume) para essa zona. Os Tetra Neons são, pois, peixes muito atentos e em certa medida espertos. Apesar de não memorizarem o lugar habitual onde os alimento, conseguem seguir os Escalares porque sabem que aquele comportamento dos Escalares significa comida.

Apesar de ter referido que a organização em cardume é apenas funcional e não estruturante para a vida do Neons, não se pense que não seja importante preservar esta forma de sociabilidade. Existem alguns fenómenos que se prendem com a sociabilidade do Neon e que ajuda a que este seja reconhecido pelos outros elementos, permitindo deste modo a sua integração. Não é raro vê-los brincando à apanhada. É frequente assistir-se a pequenas corridas que simulam a mordidela na barbatana do companheiro. Aquele Neon que for solicitado por esta prática, fica obrigado a retribui-la tendo duas opções: ou corre atrás da barbatana do peixes que acabou de o solicitar, ou corre atrás de um outro peixe ainda não solicitado, fazendo com que este possa participar deste evento social. Assim, o jogo desenrola-se numa base igualitária não parecendo haver distinções ou estatutos discriminatórios.

Em resumo, este artigo tentou chamar a atenção para o aspecto singular e autónomo destes Tetras. A forma de sociabilidade em cardume só vem responder a necessidades funcionais de sobrevivência (tal como o ser humano e muitas outras espécies de animais). Esta espécie não é apenas o peixinho engraçado e vivo, meio tolo, de cores atractivas, mas um exemplo da complexidade do mundo zoológico que também se manifesta nestes pequenos animais. De referir que os comportamentos descritos provavelmente só serão observados se o aquário não estiver sobre-lotado e apresentar as condições ideais para o Paracheirodon innesi. Assim é que em aquários das lojas de animais, dificilmente se registarão estes comportamentos.

Uma última nota: o que aqui foi dito não significa que nos vossos aquários se observem estas atitudes. Volto a repetir que as condições ideais e o facto de os peixes se sentirem seguros são determinantes.

Esta espécie é riquíssima em comportamentos sociais que implicam normas e funções. Espero que tenha contribuído para esfumar um pouco a perspectiva demasiado linear com que se viam os Tetra Neons.